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quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Pinheirinhos - o retrato da violência



Pinheirinhos capitulou, infelizmente. O rastro de violência, desespero e tristeza são coisas que comovem e causam indignação. As expressões nos rostos daquelas pessoas é de quem sente o látego da dor, o desamparo e o medo. São vitimas contumaz dessa herança colonial brutal que herdamos dos colonizadores, dos 328 anos de escravidão, dos 24 anos de terror e escuridão da ditadura militar. Somente recentemente o Brasil alcançou uma nesga de luz através da democracia, ainda em processo. Muito longe de termos uma democracia substancial. E, como esse passado autoritário dormita no inconsciente coletivo desta nação, os representantes do povo não conseguem, ainda, fazer o papel que lhes cabe, a não ser fazendo uso dos antigos instrumentos de poder, da violência, da truculência, do desrespeito aos direitos humanos. 

Quem olha as imagens daquelas pessoas e da forma como elas estão sendo tratadas, temos a nítida impressão de que estão em campos de refugiados. Policia vigiando o entorno dos acampamentos, filas dos desalojados para receber uma migalha para matar a fome, mas há outra fome que aquele forte esquema não conseguirá mitigar: a fome de afeto, de sentido de pertencimento, de olhar desamparado, distante, sem que veja nada além, a não ser o medo, medo e medo. 

Sob a batuta do poderio militar, aquelas pessoas voltam de um antigo lugar que elas construíram para si, não só o lugar físico, mas dos sonhos. Querem viver, viver. Querem suas casas, seus filhos, os vizinhos, os cachorros que latem na madrugada, fiel companheiro do seu dono, e os gatos que passeiam pelos telhados; querem o riso das crianças brincando em casa, fazendo arte, acordando cedo para ir à escola. Querem tudo de volta. Era pouco, o lugar era pobre, havia uma escassez, mas os sonhos os moviam a seguir em frente. Chegaram ali, poderiam ir mais longe, pensam. E iriam. Mas o olhar agora só vê os restos de antigos sonhos. Frangalhos, pedaços, retalhos de sonhos que se confundem com a fumaça, fome, gritos, choros, tiros e dor. Era o fim. 

De outro lado porém, como afirma Safatle, "há uma parcela da população que se excita quando vê a polícia 'impondo a ordem', por mais teatral e ineficaz que seja tal imposição. Para tal parcela, a polícia é um fetiche que serve para embalar o sonho de uma sociedade de condomínio fechado". Sim “fechado” em todos os sentidos.


Helder Modesto - filósofo, escritor e professor

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