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terça-feira, 3 de abril de 2012

UTOPIA - em busca de uma nova sociedade



Era um dia na roça, uma pequena revolução francesa, um período de razão numa forma de doces caseiros. Com estas palavras o destacado Filósofo Ralf Waldo Emerson descrevia A Fazenda Brook, um golpe de sorte à racionalidade individualista da época, que se converteu em um dos experimentos de maior prestigio entre os numerosos ensaios comunitários que proliferaram nos Estados Unidos no decurso do século XIX.

Transcorria o ano de 1841, quando a paradisíaca fazenda leiteira de quase 78 hectares nas margens do sinuoso rio Charles foi ocupada por um grupo de intelectuais, musicólogos, escritores, e entre os quais encontrava-se o famoso novelista Nathaniel Hawthorne, várias damas da sociedade e dois experientes fazendeiros, comandados por Georges Ripley, com a intenção de assegurar uma união mais natural entre o trabalho manual e o trabalho intelectual, bem como conciliar o pensador ao trabalhador, preparando assim uma sociedade de pessoas livres, cultivadoras casa coisas do espírito e cultas, cujas relações recíprocas permitiriam uma vida mais integra e simples, capaz de se sair imune diante das pressões de nossas instituições competitivas e da sociedade repressora de uma vida livre.

A aritmética e o conforto se transformaram na formula mágica de Ripley, que abandonou seu magistério para buscar a Utopia. Mas em suas próprias bases, a comunidade encontrou seu próprio germe de destruição, já que sendo oficialmente uma associação de indivíduos e não uma associação comunitária, onde os membros compartilhariam todas as propriedades, a fazenda Brook se organizou como uma companhia de ações conjuntas com títulos de 500 dólares cada um, e sob um sistema de juros de cinco por cento.

Aspirava-se que dessa maneira, a taxa inicial seria o suficiente para sustentar os primeiros custos da propriedade, proporcionando sustento às famílias e cobrindo os gastos de operação do primeiro ano. Porém, o que na imaginação parecia belo e sem defeito, como projeto, nunca se efetivou por completo. Desde o início, foram raras as ocasiões em que existiram técnicos e artesãos suficientes para estabelecer as indússtrias da comunidade e promover o desenvolvimento econômico.

As duvidas e os problemas foram aumentando com o tempo. Escassearam-se os membros instruídos e não foram suficientes os dois experientes fazendeiros.  O lugar revelou-se desfavorável e foi preciso comprar toneladas de fertilizantes e complementá-las com o lodo para adubar o terreno. Tudo isso exigiu maior capital do que fora estabelecido pelo contrato, e consequentemente a fazenda se endividou. Não obstante, nem tudo foi adversidade. Ocorreram experiências que deixaram a marca dos sonhos desses homens: os fazendeiros se dedicaram à vida social e agrícola, frequentemente havia apresentações de comédias teatrais e música no refeitório comunitário, logo após serem lavadas as louças do jantar. Ocorreram festivais de verão, festas “capiras”, bailes carnavalescos, recitais e apresentação de balé, os grupos de estudos filosóficos se reuniam com frequencia e a enorme biblioteca de Ripley estava sempre repleta de pesquisadores, entre os quais, Emerson, Füller, Acott, o exímio orador e reformista trabalhista Orestes Brownson, etc.

A fazenda Brook, como a maior parte das experiências comunitárias cheias de boas intenções, e se defrontou rapidamente com o que havia mencionado o filósofo Emerson, ao reconhecer que por mais bem intencionados que fossem, tais tentativas somente criaram revoluções ilhadas que sobreviveriam graças à tolerância da sociedade global, cuja modificação almejavam. Dessa maneira, segunda as previsões do pensador, na manhã de 3 de março de 1846, a fazenda, convertida então em falanstério tipo Fourier, ficou praticamente extinta. Para comemorar a ocasião, realizo-se um baile. Infortunamente quando a orquestra iniciou seus acordes, ocorreu um incêndio, cujas labaredas eram visíveis a vários quilômetros de distancia. Todos os esforços para apagar o fogo foram inúteis. Depois, tornou-se impossível arrecadar mais fundos para a utópica fazenda.

Ficou na memória uma breve historia de um sonho que um dia há de vingar e prosperar. Esse tipo de semente demora para fazer nascer a árvore, mas ela nascerá um dia. Até lá, mergulhado no silencioso labor de quem cuida do Jardim, espero o caule do tempo que sobe a escada da esperança. 

Helder Modesto - filósofo, escritor e professor

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